terça-feira, 15 de agosto de 2023

 Tudo desapareceu


Nordeste pouco chove!
Sol forte escaldante faz a terra se enrugar
Gente forte vendo a cara feia da morte ao Deus dará...
O que se planta, pouco se colherá, mal dá pra se sustentar
Retirantes são aos montes, vão à busca de horizontes.
Numa ânsia por melhoras, é por isso vão se embora.
Sem saber o que vai dar
Em paus de araras, nas estradas empoeiradas
Varando as madrugadas, com os olhos cheios de chuva salgada
Deixam o aqui a terra árida e seca, e se afundam nas enchentes
Presos na cidade grande, na selva de pedra de gigantes
Sofrem longe dos olhos dos amigos dos parentes
Na mala levam a saudade, nos rostos estampam a tristeza
Nordestino tem nobreza, um forte com certeza!
Mesmo com tanta pobreza, passa fome e incertezas
Não amarga a sua vida nela enxerga a sua beleza
Na voz sempre uma cantiga, uma história sertaneja
Uma moda de viola, no radinho velho de pilha
Mata um pouco da saudade, da sua terra amada e querida.
Deixou lá o seu rancho ,seu berrante foi calado.
Na parede da cabana, hoje mudo e empoeirado nunca mais foi entoado
Nas lembranças as comitivas, quanto gado foi tangido.
No lombo do seu cavalo, quanta prosa, quantos causos...
Com o seu “compadre” amigo
Com seu toque emocionado, pelas muitas estradas dessa vida
Muitas léguas percorreu na lida, no sereno, chuva e sol
No ventre das madrugadas, nessas terras de meu Deus...
Muitos cantos conheceu e nunca que se perdeu
Muitas raparigas nos bordeis, muita dança e bebida,
Ao lado de mulheres da vida, muitas vezes amanheceu
Teve uma paixão proibida, que com o tempo também pereceu.
Sua cabrocha companheira
Mulher forte parideira, três rebentos ela lhes deu
Roberto o caçula, Claudionor o mais velho,
Antônio era o do meio, que Deus cedo levou.
Pois a seca o abateu,
Por falta de água e do alimento, Jesus Cristo o recolheu
O roçado, suas vaquinhas, o carro de boi quebrado.
Era tudo o que ele tinha sua riqueza e seu passado
Junto com o chão rachado, tudo desapareceu...
Hoje longe, desgarrado, sempre lembra emocionado
Com os olhos marejados, de tudo que se sucedeu.
Dos tempos das vacas gordas, da fartura das arroubas,
Tudo que lhe foi tirado, enganado e iludido
Do seu mundo foi banido.
O seu reino encantado, foi todinho destruído
Viu seu sonho de menino, ruir e desmoronar
Sua terra, sua base, a herança familiar...
Quase vira um bandido, às vezes pra fome matar
Infligiu às leis dos homens, sujou seu nome, até teve que roubar.
Agora aqui saudoso,
Magro triste e doente, solitário descontente, junta tudo novamente
Pra o sertão quente, livremente retornar.
Viu que a seca é quase nada
Comparado à impotência de ver sua morada inundada pela enchente.
Sem o poder. Da providência, viu também a indiferença estampada dessa gente bem vestida e apressada.
Que nem olha para os lados, passa reto ao sofrimento, a súplica ou ao lamento
No sertão tem falta d'água
Muitas vezes até do pão...
Mas ninguém nega um carinho, um olhar, uma palavra
Nordestino tem na alma o respeito pelo irmão. •.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

  O CANTADOR DOS COSTUMES Davi Salles Dorival Caymmi, cantor, compositor brasileiro Da voz grave de veludo Cantou o amor, os mistérios do m...